sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

Luxemburgo: ‘Foi o processo mais feio que já vivi. Fritura mesmo'


Confira a íntegra da entrevista coletiva de Luxemburgo

A coletiva aconteceu no Salão Imperial do Windsor, exatamente o mesmo local onde, no ano passado, às gargalhadas, concedeu entrevista depois da conquista do Campeonato Carioca de forma invicta. Uma curiosidade: o time B do Flamengo está concentrado no mesmo hotel para o jogo diante do Olaria. Alguns funcionários do clube repetiam como um mantra: “Nunca vi uma fase assim”.

Confira tópicos da entrevista:

Casos de indisciplina
 - A reciclagem fez muito bem para mim. Da maneira como eu agia anteriormente, até um pouco intempestivo, mudei, fui mais tolerante. Ano passado eu fui bem tranquilo e, às vezes, fechando os olhos para algum comportamento inadequado profissional, porque o Flamengo tinha que alcançar seu objetivo, que era ir para a Libertadores. Preferi mudar, aceitar e tentar me aproximar e conviver com aquilo. Em função dos dois jogos mais importantes para a etapa de trabalho nossa, preferi puxar o freio de mão. Mas eu falei: sou profissional de futebol, tenho que me focar nesses dois jogos. E foi o que eu fiz. Eu tinha a obrigação de colocar o Flamengo na Libertadores. E completamos esse objetivo agora. Eu não desviei o caminho. Faltou pulso em determinadas situações. Mas eu entendo. Na nossa conversa, ontem, senti a Patricia (Amorim) muito sozinha. Achei ela muito vulnerável, ela está muito só. A minha saída não pode ser por uma coisa normal do futebol. Desgaste tem todos os dias.

Quebra de hierarquia
- Comuniquei que seria difícil eu conviver com as coisas que aconteceram no ano passado. Falei: tenho que mudar para esse ano. Eu mudei, comecei a colocar as coisas em seu lugar. Se a diretoria não mudou, não é problema meu. Se prefere jogar os problemas para debaixo do tapete, tudo bem. Eu fiz isso e venci. Eu sou pago para comandar. Mas por onde passei, conquistei títulos, mesmo tendo desgaste.

Avaliação do trabalho
vanderlei luxemburgo coletiva (Foto: Janir Júnior / Globoesporte.com)
- Meu resultado vem com o projeto. Para o projeto que fui contratado, o resultado foi excelente. Eu conversei com eles que faria a gestão do futebol e que arriscaria a minha carreira, porque o Flamengo estava na zona de rebaixamento. E o profissional do meu nível, não é legal assumir um clube faltando dez rodadas para acabar um campeonato e o seu time podendo ir para a Segunda Divisão. Aceitei correr o risco. Quem acompanhou meu tempo no Flamengo viu como eu lutei para manter o time treinando no Ninho do Urubu. Disso eu me orgulho, me traz satisfação. E conseguimos levar o Flamengo para a Libertadores. Isso me deixou satisfeito. Estou triste por sair, acho que poderia acrescentar muita coisa. Mas satisfeito de entender que o projeto para o qual fui convidado eu consegui cumprir. Completei as etapas. Saio com dever cumprido.

Processo de fritura
- Eu já sabia que eu ia sair do Flamengo porque a notícia que saiu há um mês. Falaram que se terminasse os dois jogos, eu não seria mais o técnico e simplesmente confirmou. O jornalista que colocou essa informação sabia disso, não colocou isso porque o cara quis colocar. Ele tinha informação de que aquilo iria existir. Só que, para completar a minha etapa de trabalho, terminar com dignidade, eu tinha que terminar direito, conseguir a classificação para a Libertadores. Poucas vezes, dentro de tanto tempo de futebol, vi um desgaste tão grande e uma fritura tão grande como a que fizeram comigo, vazando informações para jornalistas, precisas, para que fosse se avolumando, e chegasse ao desgaste que chegou. Foi o processo mais feio que já vivi. Fritura mesmo.

Crise com Ronaldinho
- Eu não tenho que almoçar com jogador de futebol, ter relação fora do futebol. E, ano passado, foram ditas algumas coisas que não são cabíveis dentro do futebol. Não quero o Ronaldinho para casar com a minha filha, quero o Ronaldinho para jogar futebol e cumprir com seus compromissos. A regalia que um atleta de alto nível tem que ter é o salário que ele ganha. O clube é soberano. Não pode ficar refém de jogador, dirigente, técnico, da presidente, de ninguém. O clube é sempre soberano nesse processo. Tem que perguntar para Patricia (se o clube é refém de Ronaldinho).

Relação com jogadores
- Não tem desgaste com jogador. Agora, quem dirige tem que dar autonomia e autoridade para o comando. Quando você tem esse direito, as coisas caminham. E todas as vezes que tive esse direito, as coisas caminharam e muito bem. Não há desgaste, o que tem é um processo natural do futebol.

Semelhanças com 1995 e comparação com Zico e Marcos Braz
- Relacionar um fato ao outro é complicado. Pessoas diferentes, momentos diferentes do clube. Eu me sinto satisfeito de ter voltado ao Flamengo e ter feito esse trabalho. Uma pena isso ter acontecido. Eu nunca escondi que sou flamenguista. Se eu trabalhar amanhã no Fluminense, Botafogo ou Vasco, vou querer ganhar do Flamengo. Mas não posso negar que sou Flamengo, eu ia de bandeira para o estádio quando criança. Mas aconteceu comigo o que aconteceu com o Zico, um dos mais ilustres jogadores do futebol brasileiro. Aconteceu um desgaste caminhando. E nós somos rubro-negros, pessoas que querem o bem do Flamengo. Até com Marcos Braz, que não jogou no Flamengo, aconteceu a mesma coisa. Esse processo todo. O Flamengo não poderia desgastar tantos rubro-negros ilustres como está desgastando. Se tiver que voltar, vou voltar. Talvez não como técnico. Não queria mesmo voltar como técnico, achava que poderia acontecer isso. Voltei pelo projeto que a Patricia apresentou, mas ela interrompeu. Voltaria, mas não como técnico.
(Nota: em 1995, Luxa foi demitido por bater de frente com Romário)

Vitória da indisciplina?
- Não. Acho uma coisa natural no futebol. Eu saio do Flamengo com a cabeça erguida e com dever cumprido. Dirigente é que tem de saber se vale a pena continuar colocando coisa debaixo do tapete. Mas meu problema está resolvido, resolvi todos eles. O Flamengo alcançou seus objetivos. Se o técnico vive em função de resultado, como foi falado, é excelente. Conquistei todas as nossas metas.
 
Decisão só da Patricia?
- Ela com certeza deixou de ter autoridade de presidente. Vi isso no olho no olho, conversando com ela. (Fui) totalmente desrespeitado, sim. Faltou respeito, as coisas foram direcionadas todas para mim.

Multa rescisória
 - Não tem multa. Eu não tenho multa. O pessoal falou disso, mas eu tenho um contrato de trabalho, que a lei determina algumas regras. Eu não tenho multa, ah, tem que pagar R$ 15 milhões, R$ 20 milhões se mandar embora. O Flamengo mandou embora, tinha um contrato e só. Tem que pagar pelo prazo que eu tinha para cumprir (até dezembro de 2012).

Luxemburgo na coletiva do Flamengo de despedida (Foto: Janir Junior / GLOBOESPORTE.COM)Luxemburgo na coletiva de despedida
- O profissional de alto nível, quando tem um problema, ele não vai ficar calado. Sempre foi assim. Se a presidente do clube fala alguma coisa, ela tem que saber que está lidando com Luxemburgo, com Felipão, com Mano Menezes. Ela deveria estar preparada para saber que quando o Luxemburgo fala, tem eco, e eco volta.

Mudança de função
- Continuo como técnico, sim. Mas a reciclagem é interessante falar porque você pega o Vanderlei antes de chegar ao Flamengo e o Vanderlei no Flamengo. O tratamento com a imprensa. A gente sabe que a notícia procede, mas às vezes você tem que ser grosso, fugir do assunto quando não interessa. Eu queria que vocês entendessem que não é algo pessoal, e sim uma defesa profissional. Há um tempo atrás, se acontecesse 10% do que aconteceu aqui, eu tinha chutado o balde muito antes. Com certeza. E voltar ao Flamengo eu volto. Um dia, se for para ajudar ao clube e a um companheiro, volto com certeza. O Luxemburgo tá desgastado? Se quatro pessoas saem de uma comissão técnica, não é desgaste de um profissional só.
(Nota: O gerente de futebol Isaías Tinoco, o preparador físico Antônio Mello e o auxiliar Júnior Lopes foram demitidos)

Embates com Michel Levy

Luxemburgo na coletiva do Flamengo de despedida (Foto: Janir Junior / GLOBOESPORTE.COM)Luxemburgo deu entrevista no hotel que serve de concentração para o Flamengo (Foto: Janir Junior / GLOBOESPORTE.COM)
 
- Cada pessoa escolhe os seus pares. Quem escolheu a diretoria da Patricia foi a Patricia. Ele hoje é um homem-chave na adminstração. As declarações dele, até o off, trouxeram muito prejuízo para o trabalho. Foi onde começou os problemas de Londrina. A última dele foi chamar os jogadores de marqueteriros, que o Alex Silva estava bichado. Ali começou o desconforto muito grande. Vou falar algo que não falei na época, tinha acontecido no ano passado, aí vem minha reciclagem. Ano passado, só confidenciando, os jogadores queriam fazer uma greve. Falei: estão loucos? Briguem, busquem o seu direito, os dirigentes de futebol têm que estar preparados para uma cobrança pública de um atleta. Ele está com o salário atrasado? Então pode cobrar. E o dirigente que não paga, que não cumpre seu compromisso, tem que estar preparado. Esse ano, em Londrina, quando os jogadores não queriam treinar enquanto alguém não fosse conversar (sobre atrasados), o próprio Levy. Falei: estão loucos? Temos dois jogos importantes aqui. Eu participei o tempo todo, evitando até confrontos maiores. Isso é muito pequeno. Quando firmei meu contrato em outubro de 2010, e a Patricia cumpriu parte disso, e está fazendo força, até o próprio Michel, disse que salário atrasado era uma das coisas que trazem problema. Atleta de futebol é profissional como qualquer outro. Está sem receber, tem que jogar e não pode reivindicar?

Ação de Deivid na Justiça
- Não vaiem o Deivid, não façam isso porque ele não é mercenário. Eu peço para a torcida. Ele não está recebendo há dois anos e está jogando. Falaram para ele que não recebe porque foi contratado pelo Zico. O Michel Levy disse isso. Ele está se doando, correndo atrás. Esse cara é um profissional, não é um mercenário. Se fosse, não estaria jogando.

Caminho do Flamengo
- Está no caminho certo. Mesmo sendo demitido do Flamengo, em um ano e pouco com a Patrica, o Levy, o Veloso, com a diretoria, nós avançamos bastante. O Flamengo poderia ter aproveitado mais o grande momento do futebol brasileiro, de investimento, Copa, Olimpíadas, dinheiro chegando. O Flamengo está no caminho certo. Conseguimos com a diretoria avançar. E acho que não tem jeito de o Flamengo voltar para a Gávea para treinar. Vejo sim, uma vez por mês, voltar à Gávea para o torcedor ver seu time lá, o sócio, os conselheiros. Mas voltar como local de trabalho, seria um retrocesso muito grande. Todo o processo está crescente no Flamengo hoje.

Luxemburgo na coletiva do Flamengo de despedida (Foto: Fabio Rossi / Ag. O Globo) 
Luxemburgo na coletiva de despedida  do Flamengo (Foto: Fabio Rossi / Ag. O Globo)


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